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“O preconceito parte da resistência, mas cabe a nós resistir a ele”

Murilo Chagas é homossexual, tem 21 anos e é estudante do curso de Serviço Social da Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM). Ele é militante pelos direitos da comunidade LGBTQI+ e integrante do MESS, Movimento Estudantil do Serviço Social. A partir de seus conhecimentos e de suas vivências, Murilo aborda, um viés marxista e pouco falado do movimento LGBTQI+.

Por Gabriela de Carvalho


GABRIELA: Murilo, me conta um pouco sobre você e sobre como você foi se inserir nesses movimentos de militância.

MURILO: Bom, me engajei na militância dentro da universidade, já que só fui me assumir homossexual no 2º colegial. Sempre tive trejeitos diferentes dos padrões heteronormativos, então, desde mais novo sofri bullying na escola.

Desde que ingressei no curso de Serviço Social, participo de vários movimentos, encontros. A partir deles eu vi que o curso prezava muito pela liberdade e pelo combate a violência, independente da sua aparência física, orientação sexual, gênero. Então comecei a me envolver pelo mundo dos movimentos sociais.

GABRIELA: Como estudante de Serviço Social, você deve ter várias disciplinas que estudam os movimentos sociais, as teorias de relações de trabalho, de produção e afins. Mas, além de ser um estudante, você também é militante por direitos para a comunidade LGBTQI+. Então, como você vê o laço entre as relações de trabalho e o movimento LGBTQI+?

MURILO: Entendendo que a gente vive em uma sociedade de classes e que, pra gente alcançar, por exemplo, uma emancipação, uma garantia de direitos da população LGBTQI+, o reconhecimento, o respeito a gente não vai consolidar isso em uma sociedade capitalista. Tudo isso, a partir da compreensão de que a gente vive em sociedade patriarcal, homofóbica, racista e que a questão da sociedade de classes não diz respeito somente ao antagonismo de classes, mas também à exploração da classe dominante em cima da classe trabalhadora, já que ela se confirma de diversas formas e o preconceito e a opressão são duas das metodologias que o sistema capitalista utiliza para exploração da classe trabalhadora e das suas várias determinações.

GABRIELA: É compreensível que o sistema capitalista atua oprimindo os cidadãos de diversas formas, mas como essa opressão se vincula ao preconceito sofrido pela comunidade LGBTQI+?

MURILO: O preconceito é uma manifestação da opressão. A partir do momento que você tem a opressão de um grupo particular, então você tem as pessoas LGBTQI+ que são oprimidas pelo sistema capitalista, a partir da compreensão que este possui o seu suporte em uma relação de uma sociedade heteronomativa, ou seja, as relações só são naturais entre casais heterossexuais. Ela é racista, entendendo que coloca a população negra, a quilombola, a indígena. como subalterna a população branca. Ela é patriarcal entendendo o homem como aquele de maior poder econômico, intelectual, como superior a mulher. Portanto, o preconceito é a manifestação da opressão nessa sociedade de classes.

A partir do momento que se oprime uma população, ela começa a se colocar nos movimentos sociais, a fim de criar meios de resistência e combater a opressão. Entretanto, o sistema reage criando meios para que a opressão continue, mas, de forma mediadora. Desse modo, por exemplo, as condições de trabalho da população LGBTQI+ serão precários. Ela vai ser inserida em espaços em que o trabalho seja precário, que ela não tenha boas condições de trabalho, que não tenha acesso a direitos trabalhistas.

GABRIELA: Mas, de que forma isso é materializado na sociedade?

MURILO: Várias, entre elas, o telemarketing, haja vista que os trabalhadores de lá, em sua maioria, são pertencentes à comunidade LGBTQI+, majoritariamente, trans. Isso tudo porque é um trabalho extremamente precário. Tem desgaste psicológico, físico, horários rigorosos. Por isso, torno a repetir, as condições de trabalho são cada vez mais precárias. Como exemplo tem também a prostituição, já que grande da população trans se inseriu nesse meio. A partir daí tem-se outro debate, se ela é ou não um trabalho e, se é, por que tem que ser reconhecido, com carteira de trabalho e com todos os direitos garantidos. Isso tudo quando se discute a prostituição não é no sentido de legitimar que haja a precarização do trabalho. Ele é legitimado como meio de trabalho pra uma população que não se insere no trabalho e encontra saída somente na prostituição. Então, já que é compreendido o fato de que ela está indo para a prostituição, que ela tenha o máximo de direitos garantidos. Mas, ao mesmo tempo, há a luta para que ela não veja somente a prostituição como um caminho final para a inserção no mercado de trabalho, para que ela seja inserida em outros ramos.

É por isso que as relações de trabalho também são pautas a serem discutas pela população LGBTQI+. Essa população é classe trabalhadora também que precisa se inserir no campo de trabalho para garantir sustento nessa sociedade. E, a partir do momento que ela não tem uma condição de trabalho, tem-se uma das sequelas da comunidade LGBTQI+.

GABRIELA: Então, quais medidas devem ser tomadas para o preconceito se tornar cada vez mais escasso a fim de criar mais oportunidades de trabalho para a comunidade LGBTQI+ e, consequente, vidas melhores?

MURILO: Bom, para o preconceito acabar, as pessoas devem parar de ser preconceituosas. Como eu já disse, o preconceito é uma ramificação da opressão e, esta para ser erradicada, não precisa ser necessariamente a partir de uma mudança societária, mas, acredita-se que a partir da mudança o caminho para erradicar a opressão seja mais fácil. Contudo, há caminhos para serem seguidos no próprio sistema de forma que o preconceito seja reduzido. Por exemplo, a luta dos movimentos sociais persiste na garantia dos direitos, eles existem para legitimar a luta contra o preconceito, independente do tipo sofrido.

A partir disso, há, por exemplo, os movimentos que lutam pelos LGBTQI+, eles traçam metas que devem ser alcançadas, como o direito de utilizar o nome social, buscam meios pra isso. Essas metas são buscadas a partir de atitudes, a priori, mais amenas e pacíficas e, em caso de insuficiência, posteriormente são mais radicais.

Porém, em panoramas mais complexos que podem envolvem questões econômicas, políticas, o preconceito parte da resistência e cabe a nós é resistir a ele. O simples fato de existirmos já é resistir. Em uma conjuntura em que a violência já está tão excessiva, o existir está sendo uma forma de resistir. Porém, além disso, os movimentos sociais devem se fortalecer.


Murilo Chagas, 21.

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