Giovanna Maeda é uma jovem estudante de Design de Moda em São Paulo. Club Kid, Kabuki, Juggalo e Drag Queen, Giovanna se inspira em diversas figuras para se montar como Suzy Salaminho e nos mostra que nem toda performance e montação tem relação com a bandeira LGBTQ+.
por Anna Carla Di Nápoli
ANNA CARLA: Antes de criar a Suzy Salaminho você já se montava? GIOVANNA: Eu me monto desde 2016, que foi quando eu me mudei para São Paulo. Aqui eu conheci esse mundo Club Kid, mas eu me montava menos, era mais basiquinha. Hoje em dia eu me monto de uma maneira mais extravagante do que antes.
ANNA CARLA: De onde surgiu esse interesse? GIOVANNA: Eu acho que esse interesse surgiu do meu gosto por maquiagem e minha vontade de trabalhar com estética. A possiblidade de poder se transformar em várias coisas, vários seres. Também sofri muita influência dos meus amigos, já que a maioria deles é Drag Queen. Isso foi definitivamente uma coisa que me estimulou bastante.
ANNA CARLA: Quem são suas maiores inspirações para as montagens? GIOVANNA: Então, as minhas maiores inspirações são o kabuki, que é uma arte japonesa que deriva da palavra kabuku, que significa “ser fora do normal". É uma mistura de teatro, canto e dança antes conhecida como “teatro bizarro” e proibida em 1600 mais ou menos. Eu me inspiro muito neles, na dramaticidade, sabe? Eu adoro! Os Juggalos, uma subcultura de pessoas que se vestem como palhaços, também tem forte influência nas minhas montagens. Eu também tiro muitas ideias da cantora Maria Garcia, ela cantava em um grupo de eurodance nos anos 90 chamado Paradisio, e eu amo muito o jeito dela de trazer alegria, e de se vestir. Além desses, eu me inspiro em muitas pessoas, tanto do Brasil quanto do exterior, mas eu não conseguiria citar uma ou duas, porque tem várias que me motivam diariamente.
ANNA CARLA: De onde surgiu o nome Suzy Salaminho? GIOVANNA: Suzy Salaminho surgiu porque desde que eu sou criança até hoje, várias pessoas, que muitas vezes não se conhecem, acabam me chamando de Suzy, não sei o porquê. Então um dia um amigo meu me perguntou por que eu não trocava o nome do meu usuário no Instagram para @suzysalaminho, juntando meu suposto nome e o nome do meu gato, Salaminho, e eu curti a ideia. O mais estranho era que todo mundo me chamava pelo nome do meu usuário antigo do Instagram, que também não era meu nome real, daí eu mudei pra ver se as pessoas começavam a me chamar pelo novo user, e não é que hoje todo mundo me chama de Suzy Salaminho? Gente, eu tenho nome!
ANNA CARLA: O que muda de quando você é Giovanna Maeda para quando você vira Suzy Salaminho? GIOVANNA: Ai, eu acho que não muda nada. Quer dizer… O que muda é a estética e o jeito que as pessoas acabam me lendo, já que naturalmente elas mudam o jeito que elas me tratam. Quando eu estou vestida de uma forma tradicional, as pessoas acabam me tratando como uma pessoa normal, enquanto quando eu estou montada elas me tratam como uma pessoa meio louca, uma artista. Mas eu acho que é para isso que serve a estética, pra você conseguir fazer com que as pessoas te leiam do jeito que você quer. E isso me ajudou muito, já que quando as pessoas me vêm como Suzy Salaminho, elas acabam me vendo como eu me vejo por dentro.
ANNA CARLA: Quais são as melhores partes de se montar? GIOVANNA: Acho que a melhor parte de se montar, pra mim, é se arrumar. Eu adoro! Acho bem terapêutico pensar no look e ser esse personagem. Mas uma parte muito boa é conhecer pessoas que pensam igual a você, que tem interesses parecidos. Isso acaba te levando para lugares que você nem imaginaria que você poderia chegar, ou te levam a ver coisas que você nem imaginava que estava dentro de você.
ANNA CARLA: Você considera a Suzy como uma forma de expressar seu "verdadeiro eu" ou até mesmo uma pessoa que você gostaria de ser? GIOVANNA: Um pouco dos dois. É uma forma de expressar como eu me sinto e como eu gostaria de parecer ou ser. Definitivamente os dois.
ANNA CARLA: Qual foi a montagem que você mais gostou? GIOVANNA: A montagem que eu mais gostei de fazer até hoje foi que eu fiz para performar na Mamba Negra, uma festa de techno daqui de São Paulo. E eu gostei muito porque eu acredito que consegui passar o que eu tinha previsto, a referencia Juggalo. Foi muito bom porque a festa foi no dia do equinócio, e durante o inverno eu estava muito triste, muito depressiva e com a mudança da estação parece que tudo mudou, tudo ficou mais terroso. Eu até passei o dia inteiro no parque pra absorver a energia da terra, depois já fui me montar pra festa e parece que eu renasci e deixei a melancolia pra trás. Foi o dia que mais me marcou.
ANNA CARLA: Quanto tempo leva do começo ao fim da produção? GIOVANNA: Ai, eu nunca contei… Eu me arrumo muito rápido em comparação as minhas amigas que também se montam. Também porque eu não sou muito perfeccionista, sabe? Eu curto ser um pouco high-low. Faço uma coisa bem feita mas não perfeita, porque todo mundo tem defeitos, né? Mas o processo todo deve durar cerca de uma hora.
ANNA CARLA: Onde você acha que a Suzy Salaminho se encaixa na bandeira LGBTQ+? GIOVANNA: Eu sou bissexual, então acho que eu entraria no B. Mas eu não vejo a Suzy Salaminho como um ser que represente algum sexo. Nem toda montação tem a ver com a questão do gênero.
ANNA CARLA: Você se enxerga como uma Drag Queen? GIOVANNA: Eu nunca me via como Drag Queen, mas sim como uma Club Kid. Daí um dia uma amiga minha foi fazer uma lista de Drags para uma festa e eu fiquei me perguntando como uma mulher poderia virar Drag Queen, já que é uma busca pelo feminino. Mas eu conversei com várias pessoas e elas falaram que o ato de ser Drag evoluiu, não é mais uma busca somente pelos traços femininos, é possível explorar outros elementos completamente diferentes. Então, hoje em dia, eu comecei a me considerar uma Drag não muito convencional. Desde que eu comecei a me ver assim foram abertas mais portas pra mim, tanto externas quanto internas. Eu comecei a enxergar que eu não preciso me prender a ser uma pessoa, não preciso ser sempre ser eu. Porém isso ainda é um pouco confuso pra mim, eu não consigo desvencilhar os dois, ser outra pessoa ou fingir ser alguma coisa que eu não sou, mas espero que isso se desenvolva naturalmente.
ANNA CARLA: Vejo que você está muito presente na cena techno. Qual é a relação da personagem com a cena eletrônica underground? GIOVANNA: Acho que hoje em dia eu não estou mais tão presente. Mas em São Paulo, a cena techno funciona como uma plataforma. É um lugar onde tem muita gente e onde você consegue muita visibilidade no que faz, principalmente quando você está lá pra chamar atenção. Então eu encaro mais como uma plataforma, porque o que eu curto mesmo é a cena gótica.
ANNA CARLA: Muitas pessoas que se montam encaram suas produções também como um trabalho. Como você encara a Suzy Salaminho?
GIOVANNA: Nesse momento não. Estou trabalhando com outras coisas que me tomam muito tempo, mas eu espero que algum dia isso aconteça. Eu me monto há 3 anos, no entanto faz mais ou menos 1 ano que eu comecei a me montar mais “loucamente” e ganhar mais visibilidade no que eu faço como Suzy Salaminho. Espero que isso aconteça e eu tenha mais tempo pra pesquisar mais sobre performance e fazer uma coisa que eu sinta que estou passando minha verdade, porque não adianta eu tentar ou me forçar a fazer uma coisa que acabe não passando quem eu sou ou que eu não me sinta a vontade fazendo. Quero que as coisas venham naturalmente.
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